Saúdo-te e dou graças pela tua vida.
Em 1970 foi aprovada pelo Congresso dos EUA uma lei elaborada pelo senador Harold E. Hughes (1922 – 1996) que criava o Instituto Nacional para o Abuso do Álcool e do Alcoolismo (NIAAA), a PL91-616. Para a elaboração desta lei o senador Hughes ─ que tinha sido Governador do Estado de Iowa e seria candidato à presidência dos EUA, também era membro de A.A. desde 1952 em Ida Grove, Iowa ─ realizou audiências públicas entre os dias 23 e 25 de julho de 1969 das quais participaram entre outros, Marty Mann (1904 - 1980) - “a primeira dama de Alcoólicos Anônimos”, fundadora do Conselho Nacional para o Alcoolismo (ANC), e Bill W. co-fundador de A.A. Outros alcoólicos em recuperação foram convidados, mas não compareceram por considerar as audiências uma ameaça ao anonimato.
Esta
lei oferecia subsídios e incentivos com dinheiro público para que os Estados
desenvolvessem programas públicos e particulares criassem centros de tratamento
para auxiliar as pessoas dependentes do alcoolismo. Atrás dessa mina de ouro
correram centenas de investidores e profissionais das mais diversas áreas.
Ficou ainda mais empolgante em 1974 quando o Congresso aprovou um
aditivo àquela lei e criava o Conselho Nacional sobre Alcoolismo e
Toxicodependência (NCADD).
Clínicas de recuperação para dependentes químicos
Muitos
destes programas e centros de tratamento passaram a ser executados e dirigidos
por pessoas e profissionais, psiquiatras e psicoterapeutas, sem a devida
capacitação apenas visando o comercio, criando teorias a respeito do tratamento
que eles consideravam o mais lucrativo, escrevendo livros e panfletos que
vendiam a cura para o álcool e as drogas e, muitos deles
ostensivamente hostis à Irmandade e ao programa de A.A.
Estas clinicas oportunistas
criadas a toque de caixa foram atropelando as clinicas mais tradicionais para o
tratamento sério do alcoolismo e outras dependências que contavam com
profissionais especializados e capacitados para esse fim e eram conduzidas e
administradas de maneira responsável.
Àquela altura a Irmandade já
desfrutava de ampla aprovação da sociedade e seu modelo tinha sido usado como
referência para a discussão da lei que tinha criado tudo aquilo, no sentido de
indicar que o alcoolismo podia ser detido.
Então centenas de alcoólicos
começaram a sair destes centros após uma lavagem cerebral feita por estes
profissionais da saúde mental convencidos de que teriam uma recuperação
satisfatória desde que seguissem aqueles procedimentos científicos.
Muitos dos ingressos das clinicas não conseguindo a recuperação pelos ditos
procedimentos científicos passaram a procurar a Irmandade, porém, levando
consigo os livros, panfletos e modelo de tratamento desses centros e tratando
de incorporá-los e sobrepô-los ao programa de A.A. e se apresentando unicamente
como adictos mesmo também sendo alcoólicos e sustentando que o álcool era uma
droga tal qual e que o programa se aplicava à sua condição ignorando
propositadamente que o programa de A.A. se baseia em princípios universais,
portanto utilizável por qualquer pessoa interessada, enquanto a Irmandade de
A.A. foi criada unicamente para alcoólicos sem importar que, além dessa
condição, sejam homens, mulheres, índios, esquimós, negros, brancos,
esquizofrênicos, neuróticos, adictos a outras drogas, presidiários, obesos
mórbidos, profissionais liberais, homossexuais, empregados, desempregados
crentes, não-crentes etc.
Esta postura de confronto dos advindos das clinicas com as Tradições da Irmandade causou problemas imediatos.
Para enfrentar essa
situação, a estratégia mais simples e fácil que muitos veteranos, tomados pelo medo
e a insegurança (colocados acima por Bob Pearson), encontraram foi a de
dizer que não se poderia ler nem discutir outro tipo de literatura que não a
aprovada pela Conferência e a incitar e doutrinar os novos contra esse tipo de
influência que por sua vez passaram a pressionar as Intergrupais e os próprios
grupos a não distribuir nem vender nenhum outro tipo de literatura, incluindo
ai a recomendada pelos veteranos e pioneiros, tais como “Vinte e Quatro
Horas por Dia”, “O Sermão da Montanha”. “A Bíblia”, “O Pequeno Livro Vermelho”
etc., reduzindo o programa de A.A. à interpretação dos escritos de uma
única pessoa, no caso Bill W. e à vontade dos “donos” de Grupo.
Quanto aos declarados “cruzados”,
Grupos começaram a recebê-los com reservas quando não animosidade, a fazer
triagens e excluí-los dos Comitês de Serviço e a proibir-lhes falar de suas
outras condições, revertendo uma situação que, até a chegada massiva de
integrantes dessas clínicas com seus tratadores e seus investidores, era
considerada pacífica e normal em boa parte dos Grupos, desde a chegada em 1944
do primeiro membro declaradamente homossexual e adicto além de negro, num
pais escancaradamente racista, para tratar de seu problema com a bebida, o qual
é o único propósito da Irmandade.
Essa situação, considerada
até hoje a prova mais difícil que a Irmandade já passou, gerou preconceitos e
desconforto nos Grupos a tal ponto que em 1978 o GSO, Escritório de
Serviços Gerais, emitiu uma declaração oficial no seu Boletim, o Box 459,
num chamamento ao bom senso à tolerância e à reflexão, Bob P. (1917-2008) que
foi Gerente Geral do Escritório de Serviços Gerais (GSO), em Nova York, entre 1974
e 1984, deu uma poderosa e inspiradora palestra de encerramento da
36ª Conferência de Serviços Gerais em 26 de abril de 1986, no Hotel
Roosevelt em Nova York e da qual seguem alguns excertos: “Esta é minha 18ª
Conferência de Serviços Gerais ─ as duas primeiras como diretor da GRAPEVINE e AAWS (Serviços Mundiais de A.A.),
seguidas de quatro como administrador de Serviços Gerais ─. Em 1972 desliguei-me
completamente, até ser chamado de volta dois anos depois para servir como
gerente geral do GSO, onde permaneci até o final de 1984. Desde a Convenção
Internacional de 1985 tenho sido consultor sênior. Esta foi também a
minha última conferência e, portanto, carregada de muita emoção.
Eu gostaria de ter tempo
para expressar meus agradecimentos a todos que têm contribuído
com a minha sobriedade e para a vida com alegria com que eu tenho sido
abençoado ao longo dos últimos quase 25 anos. Mas como isto é obviamente
impossível, vou voltar atrás lembrando um provérbio citado por Bill em
sua última mensagem: ‘Saúdo-te e dou graças pela tua vida’. Pois sem
suas vidas, eu certamente não teria tido a vida incrivelmente rica que eu desfrutei.
Deixe-me oferecer minhas ideias
sobre o futuro do AA. Eu não acredito no alarme daqueles
‘resmungões’ que têm uma visão pessimista da Irmandade. Pelo contrário, da
perspectiva de meu quase quarto de século em A.A., vejo a Irmandade
maior, mais saudável, mais dinâmica e, de longe, com crescimento mais
rápido, mais globalizado, mais consciencioso, mais simples, e mais
espiritual do que quando participei da minha primeira reunião em Greenwich,
Connecticut, em julho de 1961. A.A. floresceu para além dos sonhos dos
membros fundadores.
Faço eco aqueles que sentem
que, se a Irmandade um dia vier hesitar ou falhar, não será
por causa de qualquer causa externa. Não, não será por causa de:
• centros de tratamento
• ou de profissionais da
área,
• ou da literatura
não-aprovada pela conferência,
• ou dos jovens,
• ou dos portadores de
dependências cruzadas,
• nem até mesmo dos usuários
de drogas tentando assistir às nossas reuniões.
Se nos mantivermos próximos
às nossas Tradições e Garantias e se mantivermos a mente
aberta e um coração aberto, podemos lidar com esses e outros problemas. Se
vacilarmos, falharemos e isso será simplesmente por nossa culpa. Será
porque não podemos controlar nossos próprios egos e porque somos
incapazes de conviver bem uns com os outros. Será porque temos muito
medo e insegurança, rigidez, falta de confiança e de senso comum.
Se você me perguntasse qual é o maior perigo enfrentado por A.A. hoje, eu teria que responder:
Se você me perguntasse qual é o maior perigo enfrentado por A.A. hoje, eu teria que responder:
• a rigidez crescente;
• a demanda por respostas
absolutas para minúcias;
• a pressão sobre o GSO
para ‘reforçar’ as nossas tradições;
• a triagem de alcoólicos
em reuniões;
• a proibição de
literatura não-aprovada pela Conferência;
• o estabelecimento de
mais e mais regras para controlar os grupos e seus membros.
Esta tendência à rigidez
está nos afastando cada vez mais dos nossos membros fundadores.
Bill, em particular, deve estar dando voltas em seu túmulo, pois ele foi
talvez a pessoa mais permissiva que eu já conheci. Uma de suas frases
preferidas era: ‘Cada grupo tem o direito de estar errado’. Ele era irritantemente
tolerante com seus críticos, e ele tinha fé absoluta na capacidade de AA
se autocorrigir.
Eu também acredito nisso;
então, em última análise, não vamos desmoronar. Nós não iremos
falhar ou fracassar. Na Convenção Internacional de 1970 em Miami, eu
estava na plateia naquela manhã de domingo, quando Bill fez sua breve e
última aparição pública. Ele, muito doente, estava internado no Hospital
do Coração naquela cidade e os organizadores decidiram incluir uma
rápida aparição no evento. Na manhã daquele domingo, ele foi levado ao
palco em uma cadeira de rodas, com tubos ligados a um cilindro de oxigênio;
vestindo um ridículo blazer laranja brilhante que o comitê anfitrião
tinha arrumado, ele soltou seu corpo angular e quando agarrou o pódio a
emoção tomou conta de todos. Eu pensei que os aplausos e gritos nunca
iriam parar; as lágrimas escorrendo pelo rosto de todos. Finalmente, em
uma voz firme, como o seu antigo eu, Bill falou algumas frases graciosas sobre
a multidão enorme que incluía muitos membros vindos do exterior, terminando
(como eu me lembro) com estas palavras: ‘Quando eu olho esta
multidão, eu sei que Alcoólicos Anônimos vai viver mil anos - se for a vontade
de Deus’”.
Em decorrência dessa Lei,
centenas de pessoas com problemas de adicção e alcoolismo começaram a procurar
tratamento nessas clinicas e, sem saber o que fazer após o prazo de internação
ou tratamento ambulatorial, era indicado a esses clientes que procurassem as
salas de A.A., num momento em que NA passava por momentos de dificuldades
internas. Esta situação pegou a maioria dos Grupos de surpresa e sem saber o
que fazer para resguardar o propósito único da Irmandade, o de levar a mensagem
unicamente a outro alcoólico, criaram regras extremamente rígidas para
desestimular essas pessoas a procurar a Irmandade, mesmo as alcoólicas com
outros problemas. A rigidez extremada e a intolerância tomaram conta de muitos
Grupos. Esta situação foi tema e objeto de longos e aprofundados debates, entre
os prioritários, de várias Conferências e muitas águas correram até que o bom
senso, a tolerância e a harmonia dessem sinais de restabelecimento.
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Sejam todos bem-vindos com suas colaborações de qualquer natureza, excetuando tudo que infrinja as regras do bem proceder. Lembramos sempre que nenhum dos seus membros fala "em nome de" A.A., mas, no máximo, "de" A.A. As opiniões dos alcoólicos recuperados baseiam-se sempre na propriedade de suas experiências pessoais.