sábado, 26 de março de 2022

Primeira Tradição de Alcoólicos Anônimos

Um dos botes utilizados pelo grupo Eddie Rickenbacker no Pacifico após a queda B-17

“O nosso bem-estar comum deve vir em primeiro lugar; a recuperação pessoal depende da unidade de AA.”

"1ª Tradição de AA nos diz o quanto é importante nos reunirmos em grupo, presencialmente, com objetivo comum; nossa 5ª Tradição. Ademais, todo resto é acessório e nos será acrescentado por graça e obra de Deus. Essa é Sua parte, a maior parte! devo dizer."

A unidade dos Alcoólicos Anónimos é a qualidade mais apreciada pela nossa Sociedade. As nossas vidas, as vidas de todos os que virão, dependem diretamente dela. Ficamos íntegros, ou o AA morre. Sem unidade, o coração de AA deixaria de bater; as nossas artérias mundiais deixariam de carregar a graça vital de Deus; a sua dádiva para nós seria gasta sem objetivo. De volta às suas cavernas, os alcoólicos nos reprovariam e diriam: "Que grande coisa poderia ter sido A.A."!

"Isto significa", alguns perguntarão ansiosamente, "que em AA o indivíduo não conta muito? Será que ele deve ser dominado pelo seu grupo e engolido por ele"? Podemos certamente responder a esta indagação com um sonoro "Não!". Acreditamos que não há uma irmandade na terra que dedique mais atenção aos seus membros individualmente; certamente não há nenhuma que proteja mais zelosamente o direito do indivíduo a pensar, falar, e agir como ele desejar. Nenhum AA pode obrigar outro a fazer nada; ninguém pode ser punido ou expulso. Os nossos Doze Passos para a recuperação são sugestões; as Doze Tradições que garantem a unidade de AA não contêm um único "Não o faça". Dizem, repetidamente, "Devemos..." mas nunca; " Tens que fazer!".

Para muitas mentes toda esta liberdade sedutora aos indivíduos traduz-se apenas por anarquia. Cada recém-chegado, cada amigo, que observa pela primeira vez Alcoólicos Anônimos ficam muito intrigados, eles julgam tamanha liberdade inconcebível, contudo reconhecem de imediato que AA tem uma força irresistível de propósito e ação. "Como", perguntam eles, "pode tal multidão de anarquistas funcionar plenamente? Como é que eles podem colocar o seu bem-estar comum em primeiro lugar? O que em nome do Céus os mantém em grupo?"

Aqueles que olham de perto, em breve terão a chave para este estranho paradoxo. O membro de AA tem de se conformar com os princípios da recuperação. A sua vida depende de fato na obediência aos princípios espirituais. Se ele se afastar por demais, a pena é certa e rápida; ele adoece e morre. A princípio ele se submente porque precisa, mas mais tarde descobrirá uma maneira de viver que realmente lhe agrada. Além disso, descobre que não pode manter está dádiva sem preço se por sua vez não a entregar a outros. Nem ele, nem mais ninguém poderá sobreviver a menos que se transmita a mensagem de AA. No momento em que este trabalho do Décimo Segundo Passo forma um grupo, outra descoberta nos é revelada; a maioria dos indivíduos não podem recuperar-se a não ser que haja um grupo. Surge a compreensão de que não se é senão uma pequena parte de um grande todo; que nenhum sacrifício pessoal é demasiado grande face à preservação da Irmandade. Aprende que o clamor dos seus desejos e ambições devem ser silenciados sempre que estes possam prejudicar o grupo. Torna-se evidente que o grupo deve sobreviver para que o indivíduo não pereça. 

De modo que, no início, a melhor forma de viver e trabalhar em conjunto como grupos tornou-se a questão primordial. No mundo sobre nós, vimos personalidades a destruir povos inteiros. A luta pela riqueza, poder e prestígio dilacera a humanidade como nunca antes. Se pessoas fortes estavam paralisadas na busca de paz e harmonia, o que estaria reservado ao nosso incerto bando de alcoólicos? Assim como havíamos um dia lutado e rezado pela recuperação individual, procuramos com tanta honestidade por princípios através dos quais o próprio AA pudesse sobreviver. A estrutura de nossa irmandade foi forjada à custa dos ensinamentos da experiência.

Inúmeras vezes, em tantas cidades e aldeias, revivemos a história dramática de Eddie Rickenbacker e de seus bravos companheiros quando o seu avião caiu no Pacífico. Tal como nós, eles se viram subitamente salvos da morte, continuando, contudo, a flutuar num mar cheio de perigos. Percebendo rapidamente que o bem-estar comum do grupo estava acima de tudo, e que ninguém poderia dar-se ao luxo de quer toda a água ou todo pão. Cada um precisava considerar os outros, e na fé inabalável eles sabiam que encontrariam a sua verdadeira força. E isto encontraram, em medida suficiente para superar os desafios em suas frágeis embarcações, defeitos, incertezas, dores, medo e desespero, e até mesmo a morte de um dos seus.

Assim tem sido com AA. Pela fé e pelo trabalho, fizemos valer as lições de nossa incrível experiência. Essa Fé e nossa Obra, reside hoje nas Doze Tradições dos Alcoólicos Anónimos, que - a vontade de Deus - deverá sustentar na unidade durante o tempo que Ele precisar de nós.


sábado, 10 de outubro de 2020

5ª Tradição de Alcoólicos Anônimos

Somos todos a Quinta Tradição em Alcoólicos Anônimos

Somente com uma compreensão vigorosa em razão da lógica de nossos princípios, poderemos extrair um melhor entendimento na construção de nossos destinos como sociedade e como indivíduos superando os insistentes atavismos tão nocivos para o alcance de nosso único objetivo: “cada grupo é animado de um único propósito primordial ─ o de transmitir sua mensagem ao alcoólico que ainda sofre”.

Vamos partir do pressuposto que tudo se inicia no grupo. Tudo! O tradicional em nossa estrutura é parte espiritual que individualizada nos grupos, tem responsabilidade fim ─ ANIMAR-SE na TRANSMISSÃO de SUA mensagem ao alcoólico que ainda sofre.

Então, confirmamos, a única autoridade na transmissão da mensagem de Alcoólicos Anônimos são os grupos. Essa prerrogativa só cabe a eles, quero dizer, ao tradicional. Lembre-se em ter essa observação muito clara em nossas mentes para prosseguirmos com a leitura e sua conclusão.

ÂNIMO

Animar-se seria o mesmo que estar motivado e consciente do seu papel e responsabilidade em sua comunidade. Se cultivarmos essa prioridade tão explicita em nossos grupos, impregnando seus membros e o ambiente com esta decisão, a intenção que os conduzirá de seus lares aos seus respectivos grupos, para além do encontro fraternal com companheiros de jornada, nada tão legítimo, seria o movimento em proporcionar e facilitar a construção e a permanência de um Comitê Trabalhando com Outros, vivo, em seus espaços. Tal movimento deve ter a maior relevância nos grupos. Estar sempre em primeiro plano.

Mas não! Isso não ocorre invariavelmente.

Dessa maneira poderíamos, eventualmente, nos dar até ao luxo, nesses mesmos espaços, de ceder lugar ao comportamento de Club, com o famigerado bolo e guaraná. Só para quebrar a rotina, sem prejuízos ou desvios de nosso propósito único e primordial. Estaríamos em dia com os nossos deveres e por isso tranquilos.

Isso se deve, a meu ver, pela falta de esforços ─ não digo rigor ─ individuais e coletivos no tratamento de nossas experiências legadas em nossos livros fundamentais. Por que não o rigor? O rigor em nosso caso nos mataria! Mesmo porque, nossas tradições nos advertem que não devemos exigir nada de quem quer que seja.

Somos plenos no exercício da liberdade e responsáveis pelas consequências da mesma. É uma questão de justiça! Aprendemos esta lição desde do primeiro dia que aqui chegamos. Existe uma lógica por trás desta experiência universal fundamentada em nosso meio ─ um valor ─. Esse princípio é norteador em quaisquer circunstâncias ou contexto dentro do A.A. e, mesmo fora, em nossas vidas pessoais. O CTO e suas comissões se submetem a essa mesma lógica Divina. Talvez aqui se justifique o rigor quando absorvemos em nossos corações e mentes o compromisso com outro. Uma revolução!

Tratarei deste assunto com mais propriedade e profundidade num próximo artigo acerca da nossa 1ª tradição. 

Vamos continuar nossa conversa com outra categoria que quando corroborado com a categoria anterior, fecha a questão.

TRANSMISSÃO

A categoria transmissão: atribuir algo a outrem; ato ou efeito de transmitir; contágio: capaz de contagiar, de influir no comportamento de alguém; que se espalha de uma pessoa para outra, de um lugar para outro; inoculação: [Figurado] transmissão, propagação de ideias, opiniões, doutrinas, ideologias...

O processo de recuperação individual e até mesmo coletivo, se dá em longo prazo, amorosamente, pacientemente e com firmeza nas ações. Ora, os 12 passos, nada mais é do que um plano de ação, o nosso método de recuperação do alcoolismo contido no programa de A.A..

Uma atmosfera propícia, isto é, protetora, encorajadora e fraterna, deve reinar em nossos grupos a todo custo e é nesse sentido que há inúmeras recomendações incentivando o silenciar de nossas personalidades em benefício do coletivo. Não quer dizer que não haja divergências, discussões e desacordos. Não é isso! Sabemos que na nossa diversidade reside uma grande força. Contudo, sabemos que os temas particulares ou domésticos não cabem nesses espaços, ou pelo menos, não deveriam ser estimulados por uma maioria de membros recuperados e maduros. São conteúdos altamente explosivos.

“Lembre-se do Irlandês rubicundo ─ aquele das bochechas coradas ─ e a noção de sobriedade vendida por seu padrinho”.

Já as divergências e os debates, até mesmo acalorados, em torno da nossa 5ª tradição, são bem-vindos e positivamente apreciados. É a natureza de um grupo de Alcoólicos Anônimos num movimento genuíno e próprio. Na razão de nossa existência haverá sempre o bom combate objetivando o seu aperfeiçoamento na direção do alcoólico que ainda sofre do alcoolismo. Tudo estará bem e garantido por nosso bom Deus.

Bem, é nesse sentido que a transmissão de nossos princípios e experiências se faz ao enfermiço candidato recuperar-se do alcoolismo e a se tornar um membro consciencioso de suas responsabilidades, ativo na manutenção de nossa chama. Tudo acontece por contágio, por aproximação, persuasão pelo fazer, não mais pela efêmera fala em cabeceira de mesa enaltecendo suas credenciais de tempo e de encargo nos serviços de AA. Não violentamos ninguém impondo nossos valores ou vontades. Expectativas subjetivas de tempo não cabem no processo. O tempo agora é de DEUS.

Cinco, dez anos, e continuaremos sendo recém-chegados. Leva tempo para dar o primeiro passo por inteiro. Então, se apresse, porque caso contrário suas soluções aprendidas no mundo que nos corrompem diariamente naquilo que possuímos de mais humano, nos tornando doentes e apodrecidos, tenderemos importar para o nosso Eldorado acreditando ter inventado a roda, mas na verdade estaremos nos colocando em risco e a alguns outros. Não somos uma corporação, somos a utopia. Não cumprimos metas, não temos um checklist para preencher, regras nem pensar, padrões no agir, pensar e falar, nunca! Não somos profissionais e sim servidores, recuperados no sentido mais profundo, responsáveis e de confiança, contribuindo com aquilo que há de melhor e possível. Sem medalhas ou troféus de chocolate.

Como já havia nos dito o nosso querido Co-fundador Bill W., “tudo em A.A. já foi tentado nos seus primórdios”. Em verdade, a partir de uma compreensão profunda de nossos princípios, deveríamos exportar nossa maneira de viver e existir para o resto do mundo, e não o contrário. Mas esse, Graças a Deus, não é o nosso papel. Importante nos atermos somente às nossas chinelas.

PROPRIEDADE

A categoria seguinte trata-se do pronome possesivo “sua” referindo-se a cada grupo, a posse de uma mensagem própria na sua forma. 

─ Como assim?

─ Vou explicar:

Outra premissa prevista e garantida em nossas tradições, nesse caso a 4ª tradição, é o direito de cada grupo se manifestar como individualidade de um todo. Portanto, sendo assim, reconhecido como uma entidade espiritual que possui seus próprios recursos morais, possíveis e cabíveis, para a transmissão da “sua” mensagem. Ou seja, cada grupo é um conjunto vivo, orgânico, dinâmico, próprio em particularidades, que trabalha na atração do enfermiço de sua comunidade. Nunca falaremos em uniformidade, mas sempre em unidade de diferenças e semelhanças.

É fácil concluir que os grupos não podem ser iguais na sua forma. Os componentes que formam o seu conjunto, condicionalmente, estão atrelados aos aspectos socioculturais e econômicos da sua região e classe. Contudo, não são esses fatores determinantes, caso haja indivíduos que não atendam as mesmas condições da maioria. Não fracassarão em sua reabilitação só porque compartilham do mesmo espaço aparentemente estranho a eles. O problema aqui é o favorecimento através da identificação. Quanto mais pleno for esse quesito preenchido, ou seja, na maioria dos seus aspectos, o resultado será melhor. Há de convir que o conjunto dos elementos constitutivos num grupo de Ipanema não é o mesmo em Cascadura. O mesmo aconteceria a um companheiro esquimó, comedor de foca, lá no sertão da Bahia, por mais genial e acolhedor que seja o povo daquele estado.

A sensação de pertencimento é um valor importantíssimo e facilitador na chegada de qualquer alcoólico num grupo de AA. Esse acolhimento diário é a substância que só o grupo pode proporcionar. Essa sua essência, que não é a forma, é parte da sua natureza e a encontraremos em todos nossos grupos independentemente da sua localização. A identificação com o seu novo grupo é um fator fundamental para promover esse sujeito, adoecido e humilhado, a reiterar o seu compromisso consigo e o retorno no próximo dia a mais uma reunião.

Percebam a lógica em relação a localização de um grupo e o seu trabalho de relações públicas. São estabelecidos limites dentro de um perímetro para sua atuação, determinando sua comunidade como a única base na atração dos prováveis membros, recomendando a não ultrapassar seus limites fronteiriços com outra região. Esse conhecimento vai se consolidando tacitamente através das experiências dos anos e sendo incorporado a nossa estrutura como virtude ou recomendação. Temos que respeitar os esforços desses homens e mulheres que nos antecederam, não é mesmo?

São esses, em parte, os motivos não tão óbvios, que encarregam somente os grupos da responsabilidade de transmitir a recuperação do alcoolismo aos potenciais membros de nossa sociedade.

ESTRUTURA PARALELA

Dentro da estrutura de AA, todo o Serviço, em nosso organismo, subsidia a partir do seu descolamento daquilo que é essencial, os grupos, a formação do conjunto representativo ─ áreas e distritos ─ minimamente organizados e hierarquizados, e o Legal, até chegar na Conferência. Toda essa nossa engenharia da estrutura de serviços formam uma unidade que atende, em última análise, uma única premissa: a da comunicação entre grupos do mundo inteiro. O máximo que essa estrutura paralela se permite, é “levar” a mensagem a todos os cantos mundo. Isso é muito diferente que transmiti-la.

Fique bem claro que os Distritos, as Áreas, os ESLs, a JUNAAB, o Quartel General, em NY, até mesmo, os Comitês de CTO dos Grupos, não tem condições e nem recursos espirituais para efetivar essa transmissão. No máximo, prepararam ou lançam as iscas. É extremamente irresponsável estimular nesses quadros, a presença de recém-chegados sob alegação de qualquer natureza.

Acreditamos que com o passar do tempo, nossa sociedade amadurecida, consolidou por meio das experiências, sua vocação inata. Inicialmente tímida, até mesmo inconsciente, para mais adiante ser consagrada em nossas tradições no seu objetivo único e primeiro: a 5ª Tradição! 

Ficando claro que todo o movimento de Alcoólicos Anônimos objetiva o externo, o lado de fora! Enfim, toda a sociedade! 

Esse é o trabalho: alcançar o alcoólico que ainda sofre! Reiterando uma vigorosa premissa encontrada em nosso método de recuperação - nossos 12 passos. É o coroamento do nosso método! 

A solução de nossos terríveis dilemas e angústias estão no outro: em nossos espelhos que nos tornam cada vez mais humanos... 

O verdadeiro Amor só se realiza quando caminhamos em direção ao Outro. 

Então, sirva! 

É a nossa conclusão!

Aprendi uma dura lição nessa minha curta jornada em Alcoólicos Anônimos: a certeza de ser aquilo que devo ser, e não mais, aquilo que eu desejo ser.