Salve, salve, companheirada..!
Agradeço ao Companheiro Francisco pelas imagens do nosso acervo intelectual, um tesouro que pertence à humanidade. Esses livros não são apenas papel e tinta; são a diferença entre a vida e a morte para o verdadeiro alcoólico. Eles carregam a sabedoria de quem já caminhou pela escuridão e encontrou a luz. E, no entanto, no Brasil, esse patrimônio inestimável foi sequestrado por uma lógica mercantilista que envergonha os princípios que deveriam nortear nossa irmandade.

Nosso desenho original, estabelecido por Bill W. e Dr. Bob, é claro: o autossustento. Recuperamo-nos para, então, assumir a responsabilidade por nossa existência coletiva. Nossa estrutura deve ser mantida por doações voluntárias e anônimas, não pela exploração comercial de um patrimônio que pertence a todos. Taxar esses livros com fins lucrativos é imoral. É elitizar o acesso a uma mensagem que deveria ser universal. É negar esperança a quem mais precisa.
Mas vamos além. Existem dois poderes em AA: o poder legal e o poder tradicional. O poder legal, representado por entidades como a JUNAAB, deve ser subsidiado majoritariamente pelas contribuições voluntárias do poder tradicional — os grupos e seus membros, que são a verdadeira força motriz de nossa irmandade. No entanto, entre 2014 e 2015, o poder legal se instalou em uma propriedade alugada no bairro do Tatuapé, em São Paulo, a um custo que foge completamente da nossa realidade arrecadatória. Uma máquina superestimada, que nos oferece um serviço subestimado. E o resultado? Uma política de preços das nossas obras completamente comprometedora.
A lógica, a grosso modo, é essa: viver de aparências. É como ter um dono de uma Mercedes-Benz na garagem de casa, mas sem poder tirá-la de lá porque o cartão de crédito tem o limite de um trabalhador operário de fábrica. É um absurdo. Enquanto isso, nossos livros, que deveriam ser reproduzidos com um lucro mínimo apenas para garantir sua continuidade e manutenção, são vendidos a preços que excluem aqueles que mais precisam.
E o que fazemos? Nossos livros ficam fechados, negligenciados, esquecidos. A maioria dos veteranos e grupos parece ter se acomodado a essa realidade. Nos últimos dez anos, vimos algumas mudanças, mas são lentas, insuficientes. Em AA, o bom sempre foi inimigo do melhor. E enquanto nos contentamos com o mínimo, a mensagem libertadora dos livros fundamentais — sim, estou falando de "Alcoólicos Anônimos" e "Os Doze Passos e as Doze Tradições", não do "Viver Sóbrio" — continua distante da maioria. A leitura, quando existe, é superficial. A compreensão, débil. E assim seguimos, distantes do ideal que Bill W. vivenciou naquela cozinha humilde, ao lado de seu padrinho Ebby T., que lhe transmitiu a mensagem dos Grupos Oxford. Esse relato histórico, descrito por Bill W. no último parágrafo do primeiro capítulo de "Alcoólicos Anônimos", é um testemunho poderoso de como a recuperação começa com a partilha desinteressada de uma mensagem de esperança.
Mas eu digo: chega. Chega de negligência. Chega de comodismo. Chega de permitir que um patrimônio que é nosso seja explorado por interesses que não são os nossos. É hora de colocar essa locomotiva nos trilhos. Uma nova geração está chegando, cheia de brilho e sede de sentido. Eles merecem mais do que migalhas. Merecem acesso pleno à mensagem que pode salvar suas vidas.
Não se iludam: a mudança começa conosco. Precisamos estudar, compreender e aplicar os livros fundamentais em nossas vidas. Precisamos exigir que nosso patrimônio seja tratado com o respeito que merece. E, acima de tudo, precisamos honrar o legado de nossos precursores, garantindo que a mensagem de AA seja acessível a todos, sem distinção. Porque, no fim das contas, não se trata apenas de livros. Trata-se de vidas. E vidas não têm preço.
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Sejam todos bem-vindos com suas colaborações de qualquer natureza, excetuando tudo que infrinja as regras do bem proceder. Lembramos sempre que nenhum dos seus membros fala "em nome de" A.A., mas, no máximo, "de" A.A. As opiniões dos alcoólicos recuperados baseiam-se sempre na propriedade de suas experiências pessoais.